domingo, 27 de julho de 2014

Andava

Andava.

Sempre pelas mesmas ruas.
Pelas mesmas esquinas.

Sempre pelas mesmas ruelas.
Pelas mesmas avenidas.

Sempre pelas mesmas praças.

Até que um dia,
Resolveu
Mudar.

sexta-feira, 18 de julho de 2014

Pedaços

Li em um livro que os pedaços perdidos não cabem mais dentro da gente depois que a gente os perde. É como se um vidro se estilhaçasse e tentássemos juntá-lo novamente. Mesmo que conseguíssemos reunir todos os fragmentos, ainda haveria algo errado. Aquela totalidade inicial, que fazia com o vidro fosse um, se partiu.
Não se faz um inteiro com pedaços soltos. 
Geralmente, quando uma pessoa se aproxima de nós é porque se interessa em algo. E não no alguém que somos. As pessoas se preocupam muito mais com nossos pedaços do que conosco. Querem apenas um pedaço que possam retirar, que possam usar e depois jogar o "resto" fora. 
Há amizades que se uma das qualidades ou atributos se perdessem, acabariam na hora. Há romances que se uma pequena mudança ocorrer, entram em declínio. As pessoas não querem a unidade. Elas, nós, queremos pedaços. Um pedaço de inteligência, outro de beleza, outro de bom sexo, outro de diversão, outro de companheirismo, outro de bom humor. Se não houver um pedaço, a gente joga fora o bolo. O bolo não interessa. Interessa aquele elemento diferente, o glacê, os pedaços de chocolate ou algo de enfeite. O bolo em si é desinteressante.
A gente vai perdendo pedaços e ganhando pedaços ao longo da vida. Alguém pega um pedaço nosso e às vezes deixa outro no lugar. Quando se pega pedaços e deixa pedaços, em certa medida os relacionamentos são saudáveis. O problema é quando só uma das partes pega os pedaços. É quando alguém só dá e alguém só suga. Relações parasitas. 
Fato é, que nenhum ser humano pode nos amar por inteiro. Nem nós nos amamos por inteiro. Isso se dá, principalmente porque não nos conhecemos por inteiro. Pode-se vir com um discurso humanista de auto-estima e blá, blá, blá. Mas a verdade, é que o fato de não gostarmos de nós já implica um profundo amor por si próprio. Eu me amo egoisticamente a tal ponto, que desgosto de mim por não corresponder minhas expectativas narcísicas. Eis a razão porque o conceito de auto-estima soa absurdo. Todo indivíduo se ama, ainda que não esteja feliz consigo.
O bacana mesmo é encontrar alguém que esteja interessado no bolo inteiro e não somente em partes dele. Embora ninguém vá nos conhecer por completo, há pessoas que querem devorar o bolo. Estão dispostas a ter diarreia, a engolir não somente o que gostam de comer do bolo, mas ele inteiro. É bom encontrar pessoas assim. É difícil, mas vez ou outra surge alguém.
E os pedaços que perdemos, aqueles que se vão e levam algo de nós... Não cabem mais. Não da mesma forma. Não há como repor um pedaço perdido. Pode-se ganhar um pedaço novo que se encaixe melhor que aquele, mas o mesmo pedaço não causa mais harmonia no conjunto. Somos uma totalidade que quando um pedaço é retirado, se modifica completamente. Se adapta para suprir a falta do pedaço. Somos uma totalidade feita de fragmentos, mas que não é fragmentada.
Aproveite seus pedaços. E não se preocupe se um deles se perder. Em breve se encontra outro para colocar no lugar.

quinta-feira, 17 de julho de 2014

Aquele que não é

Enterrado.
Cavando por baixo da pele.
Roendo por debaixo da unha.
Saindo pelos poros,
pelas órbitas dos olhos.

Em segredo.
Em silêncio.
Em suspensão.
Devaneio.
Solidão.

Um grito de ardência.
Um vazio de carência.
Um hiato de ausência.
Do que não mais é.

A peça que não se encaixa.
A procura que não acha.
O brinquedo fora da caixa.
A criança com mordaça.
Que não sabe brincar.

Dança sem ritmo.
Barco à deriva.
Trem de chegada e de partida
Que não sabe onde ir.

Quer entrar ou sair?
Acordar ou dormir?
Falar ou grunhir?

Dormindo sem sono.
Acordado sem dono.
Frieza e abandono
É tudo o que conhece.

Afago negado.
Desejo não realizado.
Amor não correspondido.
Amizade sem amigo.

Nada és, senão tua solidão.

terça-feira, 15 de julho de 2014

Primeiro Amor

Dizem que o primeiro amor não se esquece. Concordo. Mas diria que não é bem o primeiro.
Diria que são os primeiros.
Se cada vez que se entra em um rio não se pode entrar no mesmo duas vezes, também não se pode entrar duas vezes no amor. Cada dia a pessoa que ama é uma. Cada dia a pessoa que é amada é uma.
Não há como amar a mesma pessoa sempre.
O amor é algo que marca. Embora ninguém saiba dizer o que é, todos que já amaram sabe que ele muda a gente. Ela arranca um pedaço ou dois e troca por outros pedaços. E justamente essa troca de pedaços que torna-o exclusivo, inesquecível.
Ele muda. Constantemente. Muda porque mudamos.
Houve um momento na vida de cada um em que um primeiro dos primeiros amores ocorreu. Esse é o mais profundo. Não me refiro a uma paixãozinha momentânea. Me refiro a algo de tirar o fôlego. A um sentimento que faz o coração bater mais rápido, como se cavalos galopassem dentro do peito, só de pensar ou ouvir o nome da pessoa. O estômago revira-se e uma leve brisa percorre o interior, ali, na alma. 
O primeiro. O primeiro de todos.
É algo como uma droga. Talvez seja isso que nos faça desejar amar. Buscar sentir a mesma sensação da primeira dose de amor. É por isso que buscamos vez após outra. Até ter uma overdose.
Embora o primeiro dos primeiros seja marcante, ele pode ser superado.
O primeiro amor...
Há sempre a possibilidade de um novo primeiro amor. Sempre a possibilidade de uma nova primeira sensação. Sempre a possibilidade de uma nova overdose.

Onde Nascem os Homens?

Os homens nascem.
Nascem da terra.
De cada enxadada que sulca o chão.

Os homens nascem.
Nascem da guerra.
Do tiro disparado da arma e da bala de canhão.

Os homens nascem.
Ajoelhados em silêncio
Num quarto de oração.

Os homens nascem.
No raio do sol que desponta pela manhã.

Os homens nascem.
Nos lábios úmidos de uma mulher.
No colo quente onde encontram morada.

Os homens nascem.
No abraço da morte
Que lhes faz adormecer.

Os homens nascem.
Do papel e da tinta
E pulam para o mundo.

Os homens nascem.
No silêncio que fala
E na palavra que cala.

Os homens nascem.
Ou não.

domingo, 13 de julho de 2014

Papel e Sangue

Sangrei no papel.
Das gotas de sangue brotaram

Letras e Palavras.

Sangrei no papel.
Ele se sujou de sangue.

Sangrei no papel.
Me sujei de papel.

Sangrei no papel.
Eu sou papel.

Sangrei no papel.
Eu sou sangue.

Sangrei no papel.
Nasceu poesia.

segunda-feira, 7 de julho de 2014

Namorar

Nunca namorei ninguém. Não no sentido usual da palavra namoro.
Confesso que isso talvez seja estranho, mas já namorei de outras formas.
Parece-me que a maioria das pessoas que "namora" nunca namorou de verdade.
Na-morar é morar em algum lugar, ou mais especificamente, morar em alguém. É habitar em alguém e ser habitado por alguém.
Na-morar é morar-na. Morar na outra pessoa com quem me relaciono. É ser aquele lugar onde se quer estar depois de um dia cansativo de trabalho. É aquele lugar onde se quer descansar, colocar os pés no sofá, deitar até tarde, trocar de roupa, tomar banho, fazer as necessidades, se alimentar, ficar nu, adormecer.
Não tenho visto muitos namoros. Vejo muitos beijos na boca, muito sarro, muito sexo, mas não vejo namoros com tanta frequência.
Parece que não é fácil namorar. Não é fácil habitar e ser habitado. Não é fácil cuidar e ser cuidado. Não é fácil amar e ser amado.

Quero namorar e ser namorado.



Baseado no belíssimo poema que transcrevo abaixo:


Semântica II

Quando digo:

- Quer casar comigo?

Quero dizer:

- Se eu me transformar em uma casa

você mora em mim?

zack


(Copiado da página do Facebook Extremo Violeta - Poesia).

quinta-feira, 3 de julho de 2014

Veneno

Intragável veneno.
Efeito causticante.

Ao tocar os lábios, arde.
Na língua, corta como diamante.

Néctar divino.
Bebida embriagante.

A um desperta, ao outro adormece.
A um liberta e ao outro entorpece.

Veneno e cura.
Doce e amargura.

Vitória e ruína.
Glória e ignomínia.

Vida e morte.
Jogo de azar e de sorte.


Ausência

A resposta
que nunca vem.

O sorriso
que não foi dado.

O desejo
que não é satisfeito.

O abraço
sem braços.

O beijo
sem boca.

O olhar
sem olhos.

O toque
sem pele.

A cor
escura.

A imagem
borrada.

O rosto
desfigurado.

O sonho
que ainda não acordou.

A escultura
não esculpida.

A música
sem som.

O artista
sem o dom.

O sexo
sem genitais.

A esperança
sem futuro.

O adeus
sem partida.

O amor
sem amor.

Eternidade Temporária

Muitas coisas são eternas. Há amizades eternas. Amores eternos. Sonhos eternos. Desejos eternos.
Muitas juras eternas são feitas na eternidade. "Há de ser eterno..."
Com o passar do tempo, o que era eterno sucumbe. Se desintegra. Se esfacela. Se quebra. Acaba.
Para onde foi a eternidade das coisas eternas?

Ela nunca existiu. Sua temporalidade foi encoberta por um tempo, mas ao se banhar em uma poça de realidade surgiu violentamente e com um grito de quem diz: Eis-me aqui!

Nossas eternidades não existem. São apenas temporalidade maquiada. São apenas uma criança calçando o par de sapatos dos pais e  fingindo ser adulta. É apenas algo que não é, fingindo ser. É pura dissimulação.

A verdade é que nossas coisas eternas são finitas. Elas não são apenas finitas. Elas também possuem um começo. O que é realmente eterno, está fora do tempo, não possui começo nem fim. O que começa sempre está imbuído da possibilidade de se findar. É por isso que amores eternos acabam. É por isso que amizades eternas acabam.

Como é curioso encontrar com alguém que foi seu melhor amigo durante muito tempo e ao olhá-lo nos olhos perceber que a pessoa que está diante de si é outra. É alguém que não mais se conhece. E perceber que também é outra pessoa o eu para quem o olhar desse outro se dirige. 

O tempo nos muda. O tempo nos cura. O tempo nos adoece. O tempo nos enobrece, nos envilece, nos acresce, nos decresce e nos destrói. O tempo acaba com nossas eternidades. O tempo acaba com nossas eternidades temporárias.
Ele mostra que elas nunca foram eternidades.