segunda-feira, 28 de abril de 2014

Ouro de Tolo

Punhos cerrados. 
Coração apertado. 
Nó na garganta. 
Ultimamente ele é puro estranhamento.

Um sentimento estranho ele carrega no peito.
Um pequeno ídolo. 
Como ele anseia por destruí-lo.
Ele é um misto de esperança e desesperança. 
Um misto de orgulho e humildade. 
Mais orgulho que humildade.

Sente em sua boca um gosto amargo. 
Uma profunda vontade de cuspir.
Mas quando ele cospe sai poesia.

Vontade de seguir. 
Vontade de desistir. 
Ele é movimento dialético.
Não sabe se vai ou se fica. 
Não sabe se fica ou se vai.

Não consegue mais dormir. 
Fica acordado até tarde pensando.
Pensando que não deveria pensar.
Pensando que quer mudar de pensamento.
Mudar de música.
Mudar de filme.
Mudar de si.

Ele é um tolo.
Um tolo lutando contra o tempo.
O que fazer?

Parece que encontrou um tesouro.
Mas talvez seja só ouro de tolo.
Talvez não seja ouro.
Talvez ele só seja tolo.

É verdade.
Ele sempre foi pobre.
Ele sempre quis ouro.
Mas não saberia como gastar.

Uma vez pobre, sempre pobre.
Uma vez só, sempre só.

Ele é amargo.
Intragável como vinagre.
Então cuspam-lhe de uma vez.
E deixem-no no chão a se evaporar.

domingo, 27 de abril de 2014

Cisma

Há dias em que ele cisma em ler poesia.
Olha na janela do ônibus e vê palavras caminhando na calçada,
Olha para o trânsito e vê pontos em alta velocidade.

Há dias em que cisma em ser apaixonado.
Olha para as estrelas e vê brilho,
Olha para os pássaros e vê canções.

Há dias em que cisma em ser angustiado.
Olha pro céu e vê nuvens,
Olha pras cores e vê cinza.

Há dias em que cisma em ser ele.
Olha pra si e não vê nada.
Olha pra si e não sabe quem é.

Há dias em que ele cisma em cismar.
Olha para tudo e cisma,
Olha para nada e cisma.




quarta-feira, 23 de abril de 2014

Embriagado

Movo-me diferente de antes. Ultimamente as coisas estão indo melhor, graças a Deus.
Mas ainda assim, é estranho sentir-se embriagado.
O efeito do álcool turva meus sentidos, minha mente, meu mundo.
Tocar é diferente. Olhar é diferente. Ouvir é diferente. Orar é diferente. Cheirar é diferente. Falar é diferente.

Meus sentidos não são os mesmos. Acho que não sou mais o mesmo.
Eu havia prometido a mim mesmo que não iria mais beber. Prometi que me manteria sóbrio, que iria parar de me embriagar.
Da última vez que caí na rua bêbado e vomitando foi difícil levantar.
Dei uma pausa. E mesmo após ter voltado a frequentar o bar, não havia problema.

Mudei de bar. Não queria mais beber.
Mas é estranha a bebida.
Depois que a gente vicia, é apenas questão de tempo.
Pode-se ficar um tempo sem, mas acaba-se voltando.

É curioso. Passo o dia querendo mais uma dose.
Passo o dia querendo mais um pouco.

Beber.
Coisa tola.
Coisa que turva os sentidos.
Coisa que enebria a mente e me impede de pensar, de ouvir os outros, o Outro, e a mim mais claramente.

Queria parar de beber.
Mas nesse momento já é tarde.
Ainda quando escrevo estou embrigado.

Estas palavras estão cheias de álcool.
Cuidado para não se embriagar também.
É difícil se manter sóbrio de novo.

Não sei quanto tempo vai durar essa embriaguez.
Pode demorar ou pode passar rápido.
Queria que não passasse.
Mas quem sabe?

QUE NÃO SEJA ETERNO, POIS RÁPIDO EVAPORA O ÁLCOOL,
MAS QUE SEJA ALCOÓLICO ENQUANTO DURE.

Medo

Um efeito paralisante injetado em minhas veias. Injetado do lado de dentro do corpo. Não utilizei uma seringa. Não é heroína. É "covardina". Possui o mesmo efeito viciante, delirante e alucinógeno, mas é diferente.
Medo.
Medo do que poderia ser. Medo do que poderia não ser.
As pernas ficam congeladas. Um tremor interno muito intenso.

"O que você teme criança tola?"
"Qual seu medo?"

Só sei ser sozinho. Só sei ser igual.
Medo de não ser sozinho. Medo de ser diferente.
Medo de querer ser dois e continuar sendo um.
Medo.

Só sei que tenho medo.
Preciso de reabilitação.

sexta-feira, 11 de abril de 2014

Querer

Sem saber o que quero, sigo querendo desquerer.
Querer que me é estranho.
Querer que me é avesso.
Que é isso que quero?

Na verdade eu bem o sei. Tento mentir pra mim mesmo.
Enganar-me com minhas próprias lorotas.
Zombando do meu próprio intelecto, 
Com quereres tão ridículos.

Como fostes parar aí querer?
Como viestes a ser?
O que te fez querer, ser assim como és?

Não sei, querer.
Não sei quem é você.
Eu sei.
Eu sei muito bem quem és.

Não quero, querer.
Simplesmente não quero te querer.
Mas te quero querer.
Infelizmente quero você.

Pensava

Pensava que era poeta e que a vida era poesia.
Pensava que era atleta e pela vida corria.

Pensava que era sonho e pela vida sonhava.
Pensava que era apaixonado e com a vida namorava.

Pensava que era viajante e pela vida viajava.
Pensava que era engraçado e com a vida se engraçava.

Pensava que era maré e a vida era maresia.
Pensava que era compositor e a vida sua sinfonia.

Pensava que pensava e por isso vivia a pensar.
Pensava que era cantor e vivia a cantar.

Pensava que era alguém e de tanto pensar algo se fez.
Pensava que era momento, instante em que se desfez.

Me

Me faço,
Me esparso,
Me amasso,
Me meço,
Me avesso,
Me compasso,
Me desfaço.

Me embolo,
Me namoro,
Me extrapolo,
Me esfolo,
Me colo,
Me choro.

Me doo,
Me magoo,
Me voo,
Me perdoo.

E paro.
Pra começar tudo outra vez.

quarta-feira, 9 de abril de 2014

Meio Sem Querer

Começa assim: timidamente. Sem planejar. Sem poder prever ou se preparar para algo que não se quer que aconteça. Algo que se aprendeu a temer que aconteça.
Começa com tímidos olhares. Com pensamentos furtivos sobre como seria caso desse certo.
Começa com tolas brincadeiras carregadas de verdade.
E quando se percebe, é para onde o pensamento se volta. É para onde o coração se volta.
Se torna uma espécie de bússola. Uma bússola que não aponta para o norte, mas que aponta para você.
Silêncio carregado de dizeres. Dizeres que às vezes nada dizem por temer o que hão de ouvir.
Medo.

Não foi de propósito e ao mesmo tempo foi. 
Nada temos em comum senão o principal.
Você nada vai saber. Ou será que já sabe?
Não deveria saber. Não poderia. Não nesse momento.

Quem sabe um dia?
Quem sabe não é para ser?
Quem sabe nós não fazemos ser?

E de pontas soltas que outrora fizeram nós com alguém, possamos simplesmente fazer nós de nós.
Poderia ser que sim.
E seria lindo.
E eu continuo assim: 
Te querendo, meio sem querer.

Algo Novo

O existente que caminha segue caminhando. Sua estrada se descortina enquanto caminha, mostrando bifurcações, abismos, pântanos, florestas, desertos, oásis, pousadas. Ele é um estranho. Já ouvira isso diversas vezes até então. E gosta de sê-lo. Ele segue em sua desarmonia harmoniosa. Em seu chaos ordenado.
Um pouco mais sensível a si ele cuida ser agora. Aprendeu um pouco mais a ouvir a si mesmo falando.
Seus pés às vezes parecem se mover sozinhos, como se soubessem onde querem chegar. Ele não precisa pensar onde quer ir. Todo movimento o impulsiona para lá. 
Enquanto caminha esquece-se de observar ao redor. Vive perdido nesse mundo entranhado debaixo da pele.
Os caminhos e descaminhos do seu existir têm-no feito crescer.
Há momentos em que ele se agrada do que vê no espelho. Há outros que ele não reconhece o rosto que o olho por detrás do reflexo.
Ele ainda está a procura de quem é.
No entanto, sabe que não é mais o mesmo. Sabe que é novo e velho. Velho e novo. Ele é algo novo.
Algo tosco, algo estranho. Mas algo seu. Não é o que os outros queriam que ele fosse. Não é o que muitas vezes ele queria ser.
Mas tudo bem. Ele é aceito. E sua realidade de ser aceito tal como é, faz com que ele se aceite. 
Ele é amado. Merecendo eterno desprezo, encontrou graça.
O caminhante sedento, o peregrino errante achou água. Fontes de Água Viva.
Água que não cessa.
Ele é estranho. Estranho e amado. Estranho e aceito. Ele é uma estranheza só.
E encontrou quem fosse mais estranho que ele. 
O Totalmente Outro.
O Totalmente Outro que é puro estranhamento.
O Totalmente Outro que o faz ser totalmente-si.