sexta-feira, 18 de julho de 2014

Pedaços

Li em um livro que os pedaços perdidos não cabem mais dentro da gente depois que a gente os perde. É como se um vidro se estilhaçasse e tentássemos juntá-lo novamente. Mesmo que conseguíssemos reunir todos os fragmentos, ainda haveria algo errado. Aquela totalidade inicial, que fazia com o vidro fosse um, se partiu.
Não se faz um inteiro com pedaços soltos. 
Geralmente, quando uma pessoa se aproxima de nós é porque se interessa em algo. E não no alguém que somos. As pessoas se preocupam muito mais com nossos pedaços do que conosco. Querem apenas um pedaço que possam retirar, que possam usar e depois jogar o "resto" fora. 
Há amizades que se uma das qualidades ou atributos se perdessem, acabariam na hora. Há romances que se uma pequena mudança ocorrer, entram em declínio. As pessoas não querem a unidade. Elas, nós, queremos pedaços. Um pedaço de inteligência, outro de beleza, outro de bom sexo, outro de diversão, outro de companheirismo, outro de bom humor. Se não houver um pedaço, a gente joga fora o bolo. O bolo não interessa. Interessa aquele elemento diferente, o glacê, os pedaços de chocolate ou algo de enfeite. O bolo em si é desinteressante.
A gente vai perdendo pedaços e ganhando pedaços ao longo da vida. Alguém pega um pedaço nosso e às vezes deixa outro no lugar. Quando se pega pedaços e deixa pedaços, em certa medida os relacionamentos são saudáveis. O problema é quando só uma das partes pega os pedaços. É quando alguém só dá e alguém só suga. Relações parasitas. 
Fato é, que nenhum ser humano pode nos amar por inteiro. Nem nós nos amamos por inteiro. Isso se dá, principalmente porque não nos conhecemos por inteiro. Pode-se vir com um discurso humanista de auto-estima e blá, blá, blá. Mas a verdade, é que o fato de não gostarmos de nós já implica um profundo amor por si próprio. Eu me amo egoisticamente a tal ponto, que desgosto de mim por não corresponder minhas expectativas narcísicas. Eis a razão porque o conceito de auto-estima soa absurdo. Todo indivíduo se ama, ainda que não esteja feliz consigo.
O bacana mesmo é encontrar alguém que esteja interessado no bolo inteiro e não somente em partes dele. Embora ninguém vá nos conhecer por completo, há pessoas que querem devorar o bolo. Estão dispostas a ter diarreia, a engolir não somente o que gostam de comer do bolo, mas ele inteiro. É bom encontrar pessoas assim. É difícil, mas vez ou outra surge alguém.
E os pedaços que perdemos, aqueles que se vão e levam algo de nós... Não cabem mais. Não da mesma forma. Não há como repor um pedaço perdido. Pode-se ganhar um pedaço novo que se encaixe melhor que aquele, mas o mesmo pedaço não causa mais harmonia no conjunto. Somos uma totalidade que quando um pedaço é retirado, se modifica completamente. Se adapta para suprir a falta do pedaço. Somos uma totalidade feita de fragmentos, mas que não é fragmentada.
Aproveite seus pedaços. E não se preocupe se um deles se perder. Em breve se encontra outro para colocar no lugar.

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